O júri mais triste que já fiz




Meu nome é Marianne Souza, sou advogada especializada na área criminal, o que me traz grandes alegrias e realizações, porém também causa tristezas. 

Trabalho no Núcleo de Prática Jurídica de uma faculdade, ou seja, os alunos, que estão no final do curso, aprendem a elaborarem petições, como se comportarem em audiência, como prestar atendimento aos assistidos e até mesmo como fazer um júri. Assim eles podem ter uma noção de como é ser advogado e decidirem sobre suas próprias carreiras.

Particularmente, sempre achei a área criminal interessante, desde o início de seu estudo, pode ser porque sou fã incondicional de livros de suspense policial (Sidney Sheldon, Dan Brown, Agatha Christie) e investigação de casos reais, mas a prática da advocacia criminal é intensa e desgastante.

Como profissional meu dever é dar voz aqueles que não tem, o acusado não pode se defender porque nossa justiça é técnica, então eu me reúno com ele, ele me confidencia a sua versão e é meu dever representá-lo.

Seja no primeiro caso, ou no mais recente, as histórias de vida me marcam, e o caso que pretendo contar foi muito particular.

Já me entristeceu desde o início, na audiência que ocorre para a preparação do plenário. Deparei-me com uma história triste e com a qual eu me identificava com a vítima, uma senhora de 69 anos, que sempre foi ativa e cuidava de tudo em casa.

Uma senhora havia acolhido seu sobrinho a pedido da sua irmã. Ele veio do nordeste, começou a fazer bicos com a entrega de panfletos, mas ele gastava seu dinheiro com bebida e drogas.

Um dia, ele chegou de madrugada em casa, a tia reclamou por causa do horário e ele bateu muito nela, ao ponto dela quase falecer. Ela ficou 6 meses no hospital. Não consigo deixar de me chocar com situações assim, é muito duro fazer júris por isso. As histórias sempre são difíceis e, para mim, é impossível não importá-las.

Passei um dia estressante no plenário, não esperava que a vítima fosse ser ouvida, devido a sua saúde, contudo ela fez questão de ir para dizer ao sobrinho que o perdoava. Ver aquela pequena senhora, na cadeira de rodas, me surpreendeu.

Primeiro porque eu não esperava que houvesse condições de que ela comparecesse e segundo, devido a sua bondade em querer confortar de alguma forma o Acusado.

As situações com as quais lidamos em qualquer julgamento são sempre as piores possíveis, é como um velório jurídico, a vítima, a família e a sociedade merecem uma resposta e usamos do sistema eleito pela Lei para a solução do conflito.

Não tenho vergonha ou timidez de expressar como me sinto porque isso faz parte de lidar com casos difíceis e melhora a minha visão como advogada, porque consigo entender como as circunstâncias alteram as teses alinhavadas pela acusação e como os jurados irão avaliar e sentir os fatos.

No dia do julgamento, reconheço que fiquei surpreendida com a vítima, sua atitude de comparecer ao plenário para ofertar uma palavra de apoio ao Acusado foi muito forte para todos. Fora isso, nada foi incomum ou diferente.

Mas os fatos eram incompreensíveis, inaceitáveis para qualquer um de nós. E aí reside o papel do criminalista, conhecer o processo, dar sua opinião jurídica para o assistido e ouvir o que ele tem a dizer sobre os fatos.

Toda pessoa tem o Direito à Defesa, não importa o que ela tenha feito. Sem um advogado para representá-la não há processo e não há resposta por parte da sociedade para os fatos.

Defendo e defenderei todos os casos que surgirem, sei que este é o meu trabalho e meu dever, oferecer a melhor Defesa possível para quem precisa e isso não significa impunidade, mas sim a garantia do devido processo legal. A garantia de ser acusado, mas poder se defender com as mesmas armas, como garantido na Lei.

Passei uns dias incomodada com a história daquele plenário, mas a justiça dos homens já havia sido realizada, ainda pendiam recursos, mas a minha parte há havia sido feita.


Ser advogado criminalista não significa apoiar a criminalidade para ter casos, mas auxiliar a resolver os que já existem.


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